Os palestinos obtiveram o novo status de Estado não-membro das Nações Unidas e poderão ter acesso a cortes internacionais. EUA votaram contra. O Estado de Israel sofreu nesta quinta-feira (29) seu segundo revés diplomático contra os palestinos em pouco mais de uma semana. Há oito dias, o grupo radical islâmico Hamas saiu fortalecido após um acordo de cessar-fogo com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, que pôs fim à ofensiva militar contra a Faixa de Gaza. Agora, por 138 votos a favor (entre eles o do Brasil e da França) e 9 contra (incluindo Estados Unidos, Canadá e Israel), com 41 abstenções (como a do Reino Unido), a Assembleia Geral das Nações Unidas elevou o status da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) de "entidade observadora" para "Estado observador não-membro". Por trás dos termos burocráticos da ONU, está o reconhecimento da maioria da comunidade internacional de que os palestinos têm direito a requerer um Estado com base nas fronteiras pré-1967, quando Israel anexou Jerusalém Oriental e passou a fixar colônias nos territórios da Faixa de Gaza e da Cisjordânia.
Essa prerrogativa já vinha sendo endossada pela ONU ao longo dos anos, por meio de várias resoluções. A diferença, agora, é que a OLP ganha mais força diplomática para acionar Israel em instâncias internacionais. Com o novo status, os palestinos acreditam poder ser aceitos no Tribunal Penal Internacional. Com isso, teoricamente poderão mover processos contra militares e governantes israelenses por supostos crimes de guerra. No entanto, o efeito prático desse novo cenário ainda é nebuloso.
O presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP, braço administrativo da OLP na Cisjordânia), Mahmoud Abbas, usou a tribuna da ONU para afirmar que a decisão da Assembleia é o "primeiro passo" para retomar as negociações de paz com Israel e estabelecer o Estado palestino de fato. Ele não abdicou de nenhuma das reivindicações históricas dos palestinos, como Jerusalém Oriental como capital e as fronteiras pré-1967 como demarcação do futuro Estado. A ANP ganhou o apoio do Hamas nessa luta. Mas Israel rejeita negociar. Argumenta que os Acordos de Oslo, de 1993, previam a necessidade de os dois lados chegarem a um consenso, sem decisões unilaterais, como é o caso da iniciativa palestina na ONU.
Saiba abaixo o que mudou, o que permanece na mesma condição e o que segue incerto após a decisão da Assembleia Geral.
O QUE MUDOU
Como Estado observador não-membro, a OLP passa a ter legitimidade para assinar convenções da ONU sobre questões sociais e aderir a novos tratados. Também terá acesso pleno à Corte Internacional de Justiça (CIJ). A CIJ é um tribunal da ONU que arbitra sobre questões conflituosas entre Estados. O órgão já emitiu pareceres em que declarou a ilegalidade da ocupação israelense e a construção de assentamentos judaicos nos territórios palestinos. A OLP pode, agora, pedir à CIJ que imponha sanções contra Israel por descumprir tratados como os protocolos adicionais da Convenção de Geneva, que proíbem o deslocamento forçado de uma população dentro do seu território (como é o caso dos palestinos que são obrigados a sair de áreas onde são instaladas as colônias). Esta é uma das preocupações de Netanyahu
O QUE NÃO MUDOU
Em sua condição atual, a OLP permanece sem direito a voto na Assembleia-Geral e nas outras instâncias da ONU, como o Conselho de Segurança (o que poderia ocorrer como membro temporário). Os palestinos também continuam impedidos de propor resoluções e de se candidatar a qualquer cargo em agências da ONU.
O QUE ESTÁ INCERTO
Negociação de paz
Deve aumentar a pressão internacional sobre Israel. Seu maior aliado, os Estados Unidos, votaram contra a proposta palestina, mas países como Espanha e França deram apoio à OLP. O governo de Netanyahu se ampara na ideia de que um movimento unilateral fere o princípio dos Acordos de Oslo, segundo o qual os dois lados devem chegar a uma solução comum para o conflito. Israel, porém, não expressa disposição de voltar à mesa de negociações, mesmo após ter acertado um cessar-fogo com o Hamas. Os palestinos terão agora o argumento de que a comunidade internaiconal os reconheceu como um Estado e, portanto, eles não podem ter restrições dentro do seu próprio território - apesar de a extensão e as fronteiras desse território ainda não estarem definidas.
Processos contra israelenses no TPI
O Tribunal Penal Internacional é a instância que julga crimes de guerra e contra a humanidade cometidos por indivíduos. Como Estado reconhecido na ONU, a Palestina quer se tornar membro do TPI. Obtendo essa condição, teria direito de entrar com ações contra militares e governantes de Israel por supostos crimes praticados nas operações militares em territórios palestinos. Mas há uma controvérsia: o Estatuto de Roma, que criou o TPI, não é claro em relação à legitimidade do tribunal de indiciar cidadãos de países que não são signatários do documento. Esse é o caso de Israel. O TPI já passou por uma situação parecida no caso do ditador sudanês Omar al-Bashir. O Sudão não assinou o estatuto, mas os promotores do TPI entenderam que poderiam indiciá-lo porque foi o Conselho de Segurança da ONU que pediu a intervenção da corte no caso de Bashir. Nesse caso, não está explícita no texto do Estatuto de Roma a restrição da jurisdição do TPI aos Estados signatários. É um tema complexo, sobre o qual não há consenso. Por mais que a Palestina venha a pedir investigação sobre cidadãos israelenses, o governo de Israel terá argumentos para contestar a legitimidade dessa medida.
Fonte: Revista Época.
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