Ainda em vida, um abalado Bento XVI admite não ter forças para conduzir a Santa Sé e lança uma sucessão que definirá os rumos do mundo católico. A missa da Quarta-Feira de Cinzas começava, na lotada Basílica de São Pedro, quando o silêncio foi cortado por uma voz frágil e vacilante nas caixas de som. “Acompanha com Tua benevolência, ó Pai misericordioso, os primeiros passos do nosso caminho penitencial, e que a observância externa seja correspondida por uma profunda renovação do espírito.” Ao ouvir as palavras de Bento XVI, pronunciadas ainda fora da basílica, os presentes olharam para o altar e o corredor central, na vã tentativa de encontrá-lo. O breve momento de ansiedade e confusão resumiu o sentimento na última missa do alemão Joseph Alois Ratzinger, de 85 anos, como papa. Bento XVI despedia-se dos fiéis depois de chocar o mundo com sua renúncia, anunciada no dia 11. Suas palavras falavam da chegada da Quaresma, quando os católicos devem refletir sobre suas atitudes e os ensinamentos cristãos. Nada mais simbólico. Até a escolha de um novo pontífice, a própria Igreja terá de refletir sobre seus compromissos, suas ideias e seu futuro.
No próximo dia 28, o trono de São Pedro ficará vago. Bento XVI assumirá a condição de ex-papa, apenas o sétimo de uma lista de 265 pontífices a deixar o posto dessa maneira – uma situação tão incomum que não ocorria havia 598 anos. Os prováveis motivos de tal decisão, embora não abertamente declarados, refletem o difícil momento por que passa a Igreja Católica Romana, envolta em disputas de poder e pouco sintonizada com questões do mundo em que vivem seus fiéis. Ao comunicar sua saída, durante uma reunião até então ordinária com os cardeais (o título hierárquico mais alto para os sacerdotes católicos antes do papado), Bento XVI alegou falta de “força da mente e do corpo” para continuar sua missão. Sua deterioração física nos últimos meses era evidente, com dificuldades de caminhar e falar – o Vaticano admitiu que ele usa um marca-passo “há algum tempo”. É possível que já não aguentasse mais uma agenda com compromissos exaustivos no exterior, como a Jornada Mundial da Juventude, evento que reúne milhões de católicos e cuja próxima edição será no Rio de Janeiro, em julho. Segundo o jornal do Vaticano, o L’Osservatore Romano, Bento XVI já pensava em renunciar desde uma viagem a México e Cuba, em março passado, quando feriu a cabeça. Mas não há dúvidas de que a opção pela renúncia baseou-se em muito mais que o simples peso da idade.
Fonte: Revista Época
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